Copia de Ordo Fratrum Minorum Capuccinorum

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updated 9:47 AM UTC, Nov 13, 2024

Um histórico dia franciscano

Na recordação dos 500 anos da Bula “Ite vos”

Roma. O último dia 23 de novembro foi inesquecível. Um sol morno, mais primaveril que outonal, iluminou-o desde a aurora. Quatrocentos frades franciscanos, todos pertencentes à Família Franciscana nas diversas denominações (Menores, Conventuais, Capuchinhos, Terceira Ordem Regular, Frades do Atonement), marcaram um compromisso para encontrar o Papa Francisco. Nas primeiras horas da manhã, chegaram à igreja de São Gregório VII, próximo ao Vaticano, onde se saudaram e se acolheram alegre e reciprocamente. Daí, mais tarde, acompanhados pelos respectivos Ministros Gerais, puseram-se em caminho rumo à Porta do Perugino e, após um minucioso e atento controle, chegaram à Sala Clementina, aonde o Papa Francisco se dirigiu para encontrá-los.

A saudação de Fr. Mauro Jöhri ao Santo Padre, na qualidade de Presidente de turno da CMG OFM e TOR, explicou também as razões do encontro: “Viemos aqui para contar-lhe o caminho que realizamos e desejamos cumprir, desde quando, em 4 de outubro de 2013, encontramo-nos junto à tumba de São Francisco, em Assis... Ao término das apresentações, o Senhor nos perguntou em tom delicadamente, e talvez propositalmente maravilhado: ‘Mas, então, existe também um ecumenismo franciscano?’. E, em seguida, acrescentou: ‘Permaneçam unidos!’. Santo Padre, acolhemos com alegria aquele convite, e hoje, brevemente, conto-lhe o que temos feito”.

Fr. Mauro descreve, portanto, o que se tem feito neste tempo: “Inicio recordando o V Centenário da Bula papal ‘Ite vos’, promulgada por Leão X, em 29 de maio de 1517, cujo intuito era o de unificar todas as várias agregações franciscanas do tempo, sob a jurisdição de um só Ministro Geral. A Bula não teve êxito positivo, e assistiu-se à separação entre os Frades Menores e os Frades Menores Conventuais. Transcorridos 11 anos, em 1528, o Papa Clemente VII confirmou a reforma dos Frades Menores Capuchinhos. Juntamente com a gratidão pelas grandes coisas que o Espírito do Senhor realizou nos diversos componentes da família franciscana, devemos reconhecer que também vivemos tempos de tensão e de discórdia. A recorrência do oitavo centenário do ‘Perdão de Assis’ foi a feliz ocasião para nos pedirmos perdão e, assim, em 11 de julho de 2016, na Basílica de Santa Maria dos Anjos, vivemos uma celebração de reconciliação e de paz. De 29 de maio a 2 de junho deste ano, os Frades Franciscanos da Úmbria, com os respectivos Ministros e Vigários Gerais, encontraram-se em Folinho para um Capítulo, que quiseram chamar ‘Capítulo Generalíssimo’. A gratidão, o desejo de comunhão e a esperança caracterizaram o evento”.

Fruto deste caminho compartilhado foi a criação de uma universidade franciscana, já em fase de realização, e o nascimento em poucos dias, em Rieti, de uma fraternidade composta de Frades Menores, Menores Conventuais e Menores Capuchinhos. Fr. Mauro recordou também, outras iniciativas compartilhadas, como os cursos trimestrais de formação para missionários em Bruxelas e, a partir deste ano, os cursos de atualização para formadores das três Ordens masculinas na África.

À saudação de Fr. Mauro em nome de todos os presentes, o Santo Padre respondeu com um discurso articulado em torno do tema da “minoridade”, lugar de encontro com Deus, com os irmãos e com a criação. Transcrevemos alguns trechos.

A minoridade é lugar de encontro com Deus: “A minoridade caracteriza de maneira especial a vossa relação com Deus. Para São Francisco, o homem não tem nada de seu, a não ser o próprio pecado, e vale o que é diante de Deus e nada mais. Por isso, a vossa relação com Ele deve ser a de uma criança: humilde e confidente, e como a do publicano do Evangelho, consciente de seu pecado. E atenção quanto ao orgulho espiritual, ao orgulho farisaico: é a pior das mundanidades”.

A minoridade é lugar de encontro com os irmãos e com todos homens e as mulheres: “A minoridade se vive antes de tudo na relação com os irmãos que o Senhor nos deu. Como? Evitando qualquer comportamento de superioridade. Isso quer dizer erradicar os juízos fáceis sobre os outros e o falar mal dos irmãos pelas costas – isso está nas ‘Admoestações’! –; rejeitar a tentação de usar a autoridade para submeter os outros; evitar “fazer pagar” os favores que fazemos uns para com os outros, enquanto que os dos outros a nós os consideramos devidos; afastar de nós a ira e a perturbação pelo pecado do irmão”.

A minoridade, lugar de encontro com a criação: “Para o Santo de Assis, a criação era ‘como um livro esplêndido onde Deus nos fala e transmite algo da sua beleza’. A criação ‘se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços’. Hoje – sabemo-lo – esta irmã e mãe se rebela porque se sente maltratada. Diante do deteriorar-se global do ambiente, peço-vos que, como filhos do Pobrezinho, entreis em diálogo com toda a criação, emprestando-lhe a vossa voz para louvar o Criador, e, como fazia São Francisco, tende por ela um particular cuidado, superando qualquer cálculo econômico ou romanticismo irracional. Colaborai com as várias iniciativas no cuidado da casa comum, recordando sempre a estreita relação que há entre os pobres e a fragilidade do planeta, entre economia, desenvolvimento, cuidado pela criação e opção pelos pobres”.

Terminado o discurso, o Santo Padre saudou muito afetuosamente todos os frades presentes, acolhendo-os e abraçando-os um a um, e concedendo-lhes a sua bênção apostólica.

Emocionados e felizes, os franciscanos retornaram ao local de onde tinham partido e aí, em uma sala da paróquia de São Gregório VII, compartilharam o almoço com muita simplicidade e sem qualquer formalidade. Ao término, no início da tarde, os frades se saudaram e cada um regressou ao próprio convento. Um dia esplêndido, que permanecerá por muito tempo nas recordações de cada um e nos anais da família franciscana.

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Textos:

 

DISCURSO DO SANTO PADRE FRANCISCO AOS MEMBROS DAS FAMÍLIAS FRANCISCANAS DA PRIMEIRA ORDEM E DA TERCEIRA ORDEM REGULAR

Sala Clementina
Quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Caros irmãos,

o “Senhor Papa”, como o chamava São Francisco, acolhe-vos com alegria, e em vós acolhe os irmãos franciscanos que vivem e trabalham em todo o mundo. Obrigado pelo que sois e pelo que fazeis, especialmente em favor dos mais pobres e desamparados.

“Em geral todos se chamem frades menores”, lê-se na Regra não bulada. Com esta expressão, São Francisco não fala de algo facultativo para seus irmãos, mas manifesta um elemento constitutivo da vossa vida e missão.

Com efeito, em vossa forma de vida, o adjetivo “menor” qualifica o substantivo “irmão”, dando ao vínculo da fraternidade uma qualidade própria e característica: não é a mesma coisa dizer “irmão” e dizer “irmão menor”. Por isso, falando de fraternidade, é necessário ter bem presente esta característica típica franciscana da relação fraterna, que exige de vós uma relação de “irmãos menores”.

De onde veio, para Francisco, a inspiração de pôr a minoridade como elemento essencial da vossa fraternidade?

Sendo Cristo e o Evangelho a opção fundamental de sua vida, com toda certeza podemos dizer que a minoridade, embora não carecendo de motivações ascéticas e sociais, nasce da contemplação da encarnação do Filho de Deus e a resume na imagem do fazer-se pequeno, como uma semente. É a mesma lógica do “tornar-se pobre, de rico que era” (cf. 2Cor 8,9). A lógica do “despojamento”, que Francisco atuou literalmente quando “se despojou, até a nudez, de todos os bens terrenos, para se doar inteiramente a Deus e aos irmãos”.

A vida de Francisco foi marcada pelo encontro com Deus pobre, presente em meio a nós em Jesus de Nazaré: uma presença humilde e escondida, que o Pobrezinho adora e contempla na Encarnação, na Cruz e na Eucaristia. Por outro lado, sabemos que uma das imagens evangélicas que mais impressionou Francisco foi a do lavar os pés aos discípulos na Última Ceia.

A minoridade franciscana se apresenta para vós como lugar de encontro e de comunhão com Deus; como lugar de encontro e de comunhão com os irmãos e com todos os homens e as mulheres; enfim, como lugar de encontro e de comunhão com a criação.

A minoridade é lugar de encontro com Deus

A minoridade caracteriza de maneira especial a vossa relação com Deus. Para São Francisco, o homem não tem nada de seu, a não ser o próprio pecado, e vale o que é diante de Deus e nada mais. Por isso, a vossa relação com Ele deve ser a de uma criança: humilde e confidente, e como a do publicano do Evangelho, consciente de seu pecado. E atenção quanto ao orgulho espiritual, ao orgulho farisaico: é a pior das mundanidades.

Uma característica da vossa espiritualidade é a de ser uma espiritualidade de restituição a Deus. Todo o bem que há em nós ou que nós podemos fazer é dom d’Aquele que, para São Francisco, era o Bem, “todo o bem, o sumo bem”, e tudo deve ser restituído ao “altíssimo, onipotente e bom Senhor”. Fazemo-lo através do louvor, fazemo-lo quando vivemos segundo a lógica evangélica do dom, que nos leva a sair de nós mesmos para encontrar os outros e acolhê-los em nossa vida.

A minoridade é lugar de encontro com os irmãos e com todos homens e as mulheres

A minoridade se vive antes de tudo na relação com os irmãos que o Senhor nos deu. Como? Evitando qualquer comportamento de superioridade. Isso quer dizer erradicar os juízos fáceis sobre os outros e o falar mal dos irmãos pelas costas – isso está nas “Admoestações”! –; rejeitar a tentação de usar a autoridade para submeter os outros; evitar “fazer pagar” os favores que fazemos uns para com os outros, enquanto que os dos outros a nós os consideramos devidos; afastar de nós a ira e a perturbação pelo pecado do irmão.

Vive-se a minoridade como expressão da pobreza que professastes, quando se cultiva um espírito de não apropriação nas relações; quando se valoriza o positivo que há no outro, como dom que vem do Senhor; quando, especialmente os Ministros, exercem o serviço da autoridade com misericórdia, como exprime magnificamente a Carta a um Ministro, a melhor explicação que nos oferece Francisco do que significa ser menor em relação aos irmãos que lhe foram confiados. Sem misericórdia, não há nem fraternidade, nem minoridade.

A necessidade de exprimir a vossa fraternidade em Cristo faz com que as vossas relações interpessoais sigam o dinamismo da caridade, por isso, enquanto que a justiça vos levará a reconhecer os direitos de cada um, a caridade transcende estes direitos e vos chama à comunhão fraterna; pois não são os direitos que vós amais, mas os irmãos, que deveis acolher com respeito, compreensão e misericórdia. Os irmãos são o importante, não as estruturas.

A minoridade também deve ser vivida em relação a todos os homens e as mulheres com os quais vos encontrais em vosso ir pelo mundo, evitando, com o máximo cuidado, qualquer atitude de superioridade que vos possa afastar dos outros. São Francisco exprime claramente esta instância nos dois capítulos da Regra não bulada, onde põe em relação a opção de não se apropriar de nada (viver sine proprio) com a acolhida de cada pessoa até a partilha da vida com os mais desprezados, com aqueles que são considerados realmente os menores pela sociedade: “Guardem-se os frades, onde quer que estejam (...), de apropriar-se de lugar algum ou de impedi-lo a alguém. E quem quer que venha a eles, amigo ou adversário, ladrão ou assaltante, receba-se benignamente”. E também: “E devem alegrar-se quando convivem com pessoas vis e desprezadas, com pobres e fracos e doentes e leprosos e os que mendigam à beira da estrada”.

As palavras de Francisco levam a perguntar-se como fraternidade: Onde estamos? Com quem estamos? Com quem estamos em relação? Quem são os nossos preferidos? E, dado que a minoridade interpela não só a fraternidade, mas cada um de seus membros, é oportuno que cada um faça o exame de consciência sobre o próprio estilo de vida; sobre os gastos, sobre o vestir, sobre o que considera necessário; sobre a própria dedicação aos outros, sobre o fugir do espírito de cuidar muito de si mesmos, também da própria fraternidade.

E, por favor, quando fizerdes alguma atividade para os “menores”, os excluídos e os últimos, nunca o façais de um pedestal de superioridade. Pensai antes que tudo o que fazeis para eles é um modo de restituir o que gratuitamente recebestes. Como exorta Francisco na Carta a toda a Ordem: “Não retenhais nada de vós para vós mesmos”. Fazei um espaço acolhedor e disponível para que entrem em vossa vida todos os menores do vosso tempo: os marginalizados, homens e mulheres que vivem pelas nossas ruas, nos parques ou nas estações; os milhares de desempregados, jovens e adultos. Tantos enfermos que não têm acesso a cuidados adequados; tantos idosos abandonados; as mulheres maltratadas; os migrantes que buscam uma vida digna; todos aqueles que vivem nas periferias existenciais, privados de dignidade e também da luz do Evangelho.

Abri os vossos corações e abraçai os leprosos do nosso tempo, e, após ter tomado consciência da misericórdia com que o Senhor lhes usou, usai de misericórdia para com eles, como a usou o vosso pai São Francisco; e, como ele, aprendei a ser “enfermo com os enfermos e afligir-se com os atribulados”. Tudo isso, longe de ser um sentimento vago, indica uma relação entre pessoas tão profunda que, transformando o vosso coração, levar-vos-á a compartilhar a sua mesma sorte.

A minoridade, lugar de encontro com a criação

Para o Santo de Assis, a criação era “como um livro esplêndido onde Deus nos fala e transmite algo da sua beleza”. A criação “se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços”.

Hoje – sabemo-lo – esta irmã e mãe se rebela porque se sente maltratada. Diante do deteriorar-se global do ambiente, peço-vos que, como filhos do Pobrezinho, entreis em diálogo com toda a criação, emprestando-lhe a vossa voz para louvar o Criador, e, como fazia São Francisco, tende por ela um particular cuidado, superando qualquer cálculo econômico ou romanticismo irracional. Colaborai com as várias iniciativas no cuidado da casa comum, recordando sempre a estreita relação que há entre os pobres e a fragilidade do planeta, entre economia, desenvolvimento, cuidado pela criação e opção pelos pobres.

Caros irmãos, eu vos renovo o pedido de São Francisco: E sejam menores. Deus guarde e faça crescer a vossa minoridade.

Sobre todos vós, invoco a bênção do Senhor. E, por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Obrigado!

Última modificação em Sexta, 01 Dezembro 2017 09:33

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